
Vamos ver um pouco atrás, quando o mestre de Jiu-Jitsu, Jigoro Kano, colocou regras limitando algumas ações mais contundentes, dando o nome de Judô.
No início do século XX, quem praticava o Judô, na realidade praticava o Jiu-jitsu, só que a queda resultava no final da luta. Portanto, para prosseguir no solo, a queda teria que ser pela metade, assim, com o decorrer do tempo o aperfeiçoamento das projeções foi sendo enfatizado, ganhando um treinamento mais constante, onde a luta no solo se resumia às imobilizações, que ganhavam ênfase especial por seu valor decisório.
O Jiu-Jitsu que havia ficado no Japão como uma reserva nacional, resumia-se a algumas poucas escolas, de onde saiu nosso Conde koma que, ao apresentar-se em Belém (PA), passou a ministrar aulas da arte a poucos brasileiros, dentre eles Carlos Gracie. Ai tudo começou, naquela remota década de 20.
Passados os anos, Carlos e Hélio Gracie vão para o Rio de Janeiro onde montaram uma sala (em casa) para dar aulas de Jiu-Jitsu. O que havia para se aprender com os Gracie? A arte de defesa. Uma forma suave de luta para não ser massacrado pelos ‘fortões’ da época. Hélio Gracie, para mostrar que aquela arte funcionava, adotou o mesmo caminho de Jigoro Kano, do Conde Koma e de outros lutadores da época: desafios.
Nascia o Vale-Tudo. Porque Vale-Tudo? Para enfrentar um adversário que praticava outro tipo de luta. Quais seriam as regras? Somente aquelas comuns as duas modalidades: dedos nos olhos, mordidas, puxar cabelos e golpes baixos, eram proibidos. De resto, valia tudo.
Hélio Gracie ganhava tudo. Imaginem aquele ‘fracote’ derrotando uns ‘monstros’ poderosos em sua modalidade. Ai a coisa pegou. O Jiu-Jitsu começou a ser conhecido e as pessoas procuravam Hélio Gracie para ganhar um alento na covardia do cotidiano. Mas nem por isso os ‘fracotes’ ficaram abusados ou os fortes mais valentões, porque havia uma regra: Quem sabe Jiu-Jitsu não precisa sair por ai espancando os outros para provar alguma coisa. Hélio e seus seguidores faziam isso nos ringues. A arte de defesa estava sendo consolidada dentro de cada um e apenas em casos extremos os conhecimentos do Jiu-Jitsu entravam em ação.
Na década de 60 o Jiu-Jitsu ganhava uma amplitude, que extrapolava as paredes da Academia Gracie, e começava a ter vários professores montando suas academias e formando seus alunos. O confronto entre as escolas era inevitáveis, surgindo as competições, onde somente a finalização tinha validade. As lutas demoravam em combates memoráveis na busca da vitória absoluta. Mas ficara difícil administrar muitas lutas em torneios sem fim. Surgiram as regras de pontos. Positivo no que tange a realização de campeonatos com mais participantes, mas preocupante pela ‘mediocrização’ dos lutadores em busca de pontos, desprezando as finalizações, principal objetivo de um confronto entre lutadores de Jiu-Jitsu.
Na chamada evolução, mais posições pontuáveis foram sendo incorporadas às regras, culminando com as vantagens que deixam nas mãos dos árbitros as decisões muitas vezes por interpretações distorcidas. O ponto culminante dessas distorções, está na recomendação de professores a seus alunos: “Lá, ou você pontua claramente ou finaliza, se não, não leva”.
Flávio Behring é Faixa Vermelha e Preta de Jiu-Jitsu (8º grau) e aulas na academia Runner/JK.
Artigo de Flávio Behring, Revista Top Fight, 7ª Edição de 1999.